Os telespectadores brasileiros que acompanharam a cerimônia de abertura dos Jogos de Tóquio podem ter se surpreendido com a homenagem prestada pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) a um banqueiro. O simpático senhor que apareceu na tela era Muhammad Yunus, agraciado com o “louro olímpico”, um reconhecimento para quem promove grandes realizações na educação, cultura, desenvolvimento e na paz por meio do esporte.
Nascido em Bangladesh, ele foi reconhecido pela criação de uma organização social que utiliza o esporte para gerar oportunidades de desenvolvimento para as pessoas mais pobres do mundo. Mas antes desse projeto – o Yunus Sport Club – ele já havia se notabilizado por outra iniciativa surpreendente. Certo de que oportunidades transformam pessoas, em 1983 fundou o Grameen Bank, uma instituição que tinha a ambiciosa meta de acabar com a pobreza. A ferramenta empregada para fazer esse sonho ser realidade é bem conhecida hoje em dia: o microcrédito. Yunus mirou no empreendedorismo e na geração de oportunidades e seus esforços auxiliaram milhões de famílias de baixa renda, algo que lhe deu o Nobel da Paz em 2006 e o apelido de banqueiro dos pobres.
As instituições criadas por Yunus já emprestaram mais de 12 bilhões de dólares para empreendedores de pequenos negócios em países com reduzidos níveis de desenvolvimento, pessoas a quem os grandes bancos não abrem as portas. Mas os resultados que o microcrédito proporciona não são exclusivos de países da Ásia e da África.
O Brasil é uma das nações onde a modalidade também tem forte presença. Algo que ficou bastante evidente em 2020, primeiro ano da pandemia. Segundo o IBGE, a taxa média de desemprego foi de 13,5%, a maior desde 2012, deixando cerca de 13,4 milhões de pessoas na fila por um trabalho. A alta recorde aconteceu em 20 estados, com taxas mais altas registradas no Nordeste. Em paralelo, mostram dados do Ministério da Economia, 1,044 milhão de negócios foram fechados por causa das restrições provocadas pela COVID-19. Não demorou para que o microcrédito virasse a principal alternativa para empreendedores. De acordo com o Banco Central, o saldo da carteira dessa modalidade subiu 16,5% em relação ao ano anterior.
Isso foi resultado direto das adaptações que as operadoras de microfinanças realizaram diante da adversidade provocada pelo novo coronavírus. Foi preciso aprimorar os serviços tanto no atendimento remoto ao público para proteger clientes e colaboradores quanto no desenvolvimento de produtos específicos para quem estava desempregado ou buscava uma solução rápida e eficaz para evitar o fim de um pequeno comércio ou de uma microempresa. A estratégia se mostrou acertada e o microcrédito passou a ser cada vez mais incentivado também por prefeituras, pelos governos estaduais e federal e nas casas legislativas de todo o país.
Tamanho é o poder do microcrédito que, além de servir inicialmente de suporte e de impulso para quem deseja trabalhar, produzir, gerar renda e novas vagas de emprego, a ferramenta tem uma outra faceta de eficiência mais do que comprovada: é um forte agente transformador na vida de quem mais precisa de apoio financeiro.
Hoje o microcrédito deixou de ser exclusivo para o empreendedorismo e serve de auxílio para construção da casa própria, implantação de estruturas de saneamento básico e outras necessidades do dia a dia. Em todo o Brasil, famílias que enfrentavam obstáculos para ter acesso ao mercado financeiro tradicional conseguem oportunidades para transformar a própria realidade.
Um exemplo recente é a pequena Passo do Sobrado, município de pouco mais de seis mil habitantes localizado a 138 quilômetros da capital gaúcha. Lá, um bairro onde vivem 50 famílias de baixa renda terá as residências reconstruídas com apoio do crédito oferecido em condições especiais aos moradores. Além do bem-estar para a população, o movimento aquece a economia local, com a venda dos materiais de construção e a contratação de mão de obra da própria cidade. A mudança na vida de tantas e tantas pessoas reforça a constatação de que a oferta de oportunidades é essencial para transformar a realidade. O resultado em comunidades e famílias vale mais do que uma medalha de ouro.
Isabel Baggio, presidente do Banco da Família